fbpx

Amamentar, no patriarcado, é um ato subversivo

Na amamentação o seio tem função nutricional, ele é uma fábrica de leite que serve para alimentar um bebê, e, no patriarcado, este talvez seja um dos poucos momentos (senão o único) em que uma mulher consegue dar uma função que não seja sexual a esta parte do seu corpo que é extremamente erotizada. Na relação mãe-bebê que envolve a amamentação nenhum homem está sendo sexualmente beneficiado e portanto, amamentar, no patriarcado, é um ato subversivo

E por isso, o ato de amamentar nunca é visto como algo que é: o ato, bastante altruísta, de oferecer a si para alimentar um bebê. Um seio aleatório, desnudo ou insinuado num decote é belo e desejável mas o mesmo seio alimentando uma criança é reprovável, tomado por indecente ou repugnante. Mulheres são rechaçadas, tolhidas, insultadas, coagidas a se esconder enquanto amamentam, são expulsas dos lugares públicos, incitadas a se cobrir como se tivessem realizando algum ato obsceno. 

A amamentação, no quanto, quando e como mulheres podem aleitar seus filhos, quase sempre foi um tema decidido por homens, que controlam e tutelam o corpo da mulher desde os primórdios da humanidade, levando em conta seus interesses econômicos e sexuais. Hoje temos índices bem insuficientes de aleitamento porque a ordem do dia é o enriquecimento da indústria alimentícia que produz leite artificial e mulheres precisam brigar pelo direito de aleitar. 

Homens, em geral, não apoiam suas companheiras na longa e dura jornada que é a amamentação: as deixam abandonadas na tarefa ou pressionam pelo encerramento precoce para ter de volta o objeto do seu prazer. Outros ainda transformam a amamentação da mulher num fetiche.

A amamentação de mulheres tampouco é apoiada pelo Estado, não há informação em quantidade e qualidade suficiente para as mulheres sobre amamentação. Mitos proliferam minando a confiança da mulher na sua capacidade de amamentar. Na maternidade, bebês são afastados da mãe assim que nascem contrariando a orientação de mamar na primeira hora de vida e recebem leite artificial. Os profissionais estão mal preparados e não conseguem orientar adequadamente as puérperas sobre como amamentar. A indústria alimentícia financia um poderoso lobby junto aos profissionais de pediatria para que estes sejam seus porta-vozes e engrossem o discurso do desmame substituindo ou complementando leite materno por leite artificial, ou iniciando uma introdução alimentar precoce.

A licença-maternidade oferecida pelo Estado, de apenas 120 dias, não cobre satisfatoriamente o período de amamentação exclusiva de 180 dias indicado pela OMS. Muitas creches se recusam ou não estão preparadas para manipular o leite materno enviado pela mãe para alimentar seu bebê quando esta retorna ao trabalho. São necessárias campanhas públicas para incentivar e garantir o direito ao aleitamento materno.

Nós sabemos o que é necessário para estabelecer uma amamentação bem-sucedida: tempo, espaço, recursos materiais, informação. O que não entendemos é que nada disso acontece porque não é do interesse de uma sociedade patriarcal que mulheres tenham autonomia sobre seu corpo, que dediquem-se na medida que julgam adequado aos seus filhos. Mulheres são reféns das decisões dos homens sobre seus corpos, e qualquer reivindicação que exija maior autonomia não pode ignorar o fator “patriarcado” da equação”

Cila Santos

https://cilasantos.medium.com

Escritora, feminista, mãe e ativista pelos direitos das mulheres e das crianças. Criadora do projeto Militância Materna, falo sobre feminismo, maternidade e infância, disputando consciências por um mundo melhor. Vamos juntas?

Post Relacionados

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *